Parte 1. Estudo empírico
No segundo dia deste mês de junho de 2020 realizamos estudo prático passando por um pedaço da Costa Atlântica. Os principais objetivos foram alcançados - tomamos boas doses do ar salgado e ionizado e observamos o atual estado das coisas por lá.
Destaques: nova sinalização nas estreitas pontes da RJ-165 entre divisa SP-RJ e Paraty, faixas e placas sobre proibição de acesso às praias já vencida, estradas e praias quase desertas.
Na véspera encontramos uma notícia sobre reabertura parcial das praias de Ubatuba SP no período de 1 a 15 de junho - com restrição de segunda a quinta e somente aos residentes da cidade. É claro que operacionalizar tal segregação inconstitucional dos não residentes seria uma tarefa inviável, mas a verificação deste item deixamos para segundo plano e resolvemos começar com algo mais relevante - condições de passagem pela "estrada-parque" que atravessa o PN Serra da Bocaina entre Cunha SP e Paraty RJ.
Neste trecho final encontramos um ônibus municipal andando em marcha lenta e quase sem passageiros.
Portanto escolhemos a melhor vaga no estacionamento mais próximo, de acesso escancarado. Ficou bem escondido lá, na sempre bem vinda sombra. Trocamos de roupa, tomamos o nosso lanche, e agora vamos para praia.
Mas atravessando tudo isso alcançamos a barra, onde passamos um bom tempinho em contemplação.
Nesta vez não sentimos vontade de explorar outra parte da praia e manguezais, ficamos só neste lado do rio. Mas a fauna foi ao nosso encontro.
O céu completava show com efeitos de arco-íris nas bordas de nuvens.
....cartão de visitas PARATY RJ
Mas foi difícil avaliar qual dos componentes da anti-temporada pesou mais nesta sensação de deserto e abandono: mês do ano, dia de semana, ou efeitos pós-bloqueios. De qualquer forma, tal sensação é genérica e simboliza o clima atual para viagens em geral.
Nesta fase de "relaxamentos das restrições" já é factível viajar de carro próprio, visitar alguns lugares e retornar no mesmo dia. Mas os meios de hospedagem ainda estão indisponíveis, e o transporte aéreo e rodoviário de passageiros está quase congelado, sem sinais de início de recuperação. Bem que as respectivas partes da infraestrutura ainda não foram destruídas, e teoricamente podem ser reativadas na medida de aumento da demanda. Mas aposto que neste ano 2020 a demanda não voltará nem perto dos níveis anteriores. E que muito perto mesmo não voltará nem nas próximas décadas.
Fotos do autor
Destaques: nova sinalização nas estreitas pontes da RJ-165 entre divisa SP-RJ e Paraty, faixas e placas sobre proibição de acesso às praias já vencida, estradas e praias quase desertas.
Na véspera encontramos uma notícia sobre reabertura parcial das praias de Ubatuba SP no período de 1 a 15 de junho - com restrição de segunda a quinta e somente aos residentes da cidade. É claro que operacionalizar tal segregação inconstitucional dos não residentes seria uma tarefa inviável, mas a verificação deste item deixamos para segundo plano e resolvemos começar com algo mais relevante - condições de passagem pela "estrada-parque" que atravessa o PN Serra da Bocaina entre Cunha SP e Paraty RJ.
Assim iniciamos a nossa viagem pela via Dutra até Guaratinguetá e depois seguimos pela
SP-171 (BR-459) no sentido da divisa com Rio de Janeiro. Isso permitia manter na manga um "plano B": em caso de bloqueio da divisa explorar as belezas da região serrana da Cunha: Pedra da Macela, cachoeiras, etc. Primeira parada foi no posto junto ao portal da Cunha, lá tomamos cafezinho e recebemos boa notícia: a "estrada-parque" foi reaberta ontem(!) Alguns carros vindos no sentido contrário que encontramos nas próximas dezenas de quilômetros reforçaram a expectativa de chegar até Paraty sem dificuldades, e foi isso que aconteceu: pouquíssimo tráfego e nenhuma fiscalização.
Ao chegar no trevo da BR-101 Rio - Santos viramos no sentido de Ubatuba, e passando 9,5 km saímos desta pista para acesso a Paraty-Mirim. No início da estada local houve faixa do tipo "acesso proibido", mas sem datas de vigência, portanto resolvemos verificar a validade desta informação. Ao passar pela aldeia indígena observamos outras proibições:
Mas isso foi a nosso favor: nenhum dos índios atravessou o nosso caminho tentando vender algum artesanato, como acontece nos finais de semana de verão.
Este é o seu ponto de retorno, agora menos apertado do que ocorre na verão. Mas deixar carro por aqui mesmo seria uma afronta.
Mas aquela aguinha atrás do quiosque na maré alga vira uma lagoa. É melhor contornar pelo acesso aos cais.
Deste lado sim, foi fácil descer para faixa de areia.
Que ficou estreitinha ou quase inexistente em alguns pontos.
Aos poucos esquecendo dos raros encontros com serem humanos no caminho até aqui, o que causava uma sensação estranha. Perecia que todas outras pessoas simplesmente congelaram no tempo, e só encontraremos alguém se procurarmos, possivelmente imóveis, ou se movendo em ritmo de um centésimo do normal.
Mas não foi isso que aconteceu.
Dois moradores locais entraram no seu barquinho, ligaram motor, e atravessaram o foz do rio na velocidade habitual.
A temperatura da água estava na faixa de conforto, e a transparência permitia observar fundo e peixinhos até bastante distante da margem.
Apreciamos tudo isso quase com exclusividade, nesta tarde na praia Paraty-Mirim apareceram mais cinco pessoas no total.
Primeiro foi um homem que se instalou ao lado da pilha de mesas plásticas pertencentes a um bar sazonal. Ele se serviu gratuitamente de uma mesa e uma cadeira, abriu latinha de cerveja e fixo olhos no horizonte.
Depois veio grupo de três moças que se instalou na areia formando um círculo - para tomar sol e conversar.
Mais um homem apareceu na parte inicial da praia - próxima à estradinha e mais arborizada. Ele foi mais bem preparado de todos: trouxe grande caixa de isopor, armou uma rede e deitou em paz.
Quando sentimos fome resolvemos voltar para nosso carro onde deixamos as provisões. A maré já estava recuando, mas aquela lagoa ainda atrapalhava passagem mais curta.
Mas nesta vez chegamos perto e conseguimos ler aquela placa que foi vista e longe na primeira tentativa de travessia.
O texto era bastante ameaçador, mas não condizia com a realidade. Ao voltar para casa pesquisamos este assunto e tomamos conhecimento deste D.M. 048/2020 que estava em vigor de 11 a 31 de maio. Portanto a placa estava desatualizada já há pelo menos 40 horas. Mas este Decreto é muito sintomático por ser um recuo temporário no processo de reabertura de comércio em Paraty e por incluir restrições absurdas e ilegais ao proibir entrada em Paraty até aos proprietários de casas de veraneio.
No caminho de volta passamos nos cais.
Foi muito calmo, e de um lado já apareceram nuvens mais pesadas.
E a cor da água na enseada desta frota particular foi incrível.
Caminhando pela estradinha até estacionamento encontramos alguns carros estacionados, inclusive aparentemente por muito tempo. Um deles, com placa de São Paulo SP, estava com papel de "autuação" colado no vidro, com data 7 de abril.
Depois de mais um lanche começamos nossa jornada de volta, nesta vez via Ubatuba. Paramos em uma das praias de norte e não encontramos nenhum sinal de restrições de acesso. Depois passamos ao lado da praia Vermelha do Norte, onde também não houve sinais, apenas alguns carros estacionados e poucas pessoas passeando.
Parte 2. Análise e Síntese
É claro que nesta terça-feira de junho e apenas no segundo dia depois dos meses de bloqueios de vários tipos não esperamos encontrar a praia de Paraty-Mirim tão animada quanto no dia da nossa visita no verão de 2019 (um domingo de janeiro):
É claro que nesta terça-feira de junho e apenas no segundo dia depois dos meses de bloqueios de vários tipos não esperamos encontrar a praia de Paraty-Mirim tão animada quanto no dia da nossa visita no verão de 2019 (um domingo de janeiro):
Mas foi difícil avaliar qual dos componentes da anti-temporada pesou mais nesta sensação de deserto e abandono: mês do ano, dia de semana, ou efeitos pós-bloqueios. De qualquer forma, tal sensação é genérica e simboliza o clima atual para viagens em geral.
Na avaliação dos efeitos desse pandemônio já foi dito muitas vezes que "o mundo nunca será o mesmo". Isso é banal, o mundo nunca se repete e está em mudança perpétua. Temos que busca um formulação mais clara, portanto concordo com aqueles que enxergaram o fim da época do consumismo desenfreado e do pseudo-crescimento econômico baseado em créditos para estímulo de tal consumismo. As mudanças estruturais na sociedade dita moderna são absolutamente necessárias e inevitáveis, e prometem ser longas e dolorosas, mas não quero agora entrar nestes assuntos a fundo. Nem nos mistérios do próprio pandemônio e das forças ocultas que estão por trás desse pânico generalizado.
Prefiro focar nos seus efeitos colaterais, no fundo até positivos: muitas pessoas forçadas a interromper aquela correria de sempre já repensaram valores da vida e tomaram decisão de viver de forma mais sustentável. Isso resultará na redução drástica de consumo supérfluo, mesmo em caso de fim de todas as restrições de mobilidade etc. E a indústria de turismo com seus "pacotes" será uma das principais vítimas desta nova postura dos consumidores. Muitos dos respectivos hotéis focados neste tipo de hóspede não voltarão a ser viáveis. E o transporte aéreo não contará com retorno pleno desta categoria de passageiros.
Alem disso, as viagens de negócios, inclusive para diversos eventos, também continuarão em baixa - muita coisa presencial já foi trocada pelas formas virtuais, e respectivo redução de gastos será mantido quase em totalidade.
Assim o novo ponto de equilíbrio para meios de transporte intermunicipal e interestadual de passageiros bem como para meios de hospedagem será muito abaixo dos níveis antes do pandemônio. Mas subir até este nível partindo do buraco atual não será fácil, portanto a reconquista do direito de viajar pelos adeptos de viagens independentes é algo de extrema importância.
Mas temos que entender que entre permissão administrativa para reabrir, por exemplo, uma pousada e seu funcionamento normal haverá vários obstáculos, e nos próximos vezes partir com um roteiro ultra-flexível pensando em pernoitar onde vai querer parar na hora não será aconselhável. Penso que em vez disso teremos que aumentar o nosso raio de alcance aos poucos e "com pé atrás". Ou seja, guardando na reserva opção de retorno no mesmo dia ao explorar alguma região moderadamente distante. E também tentaremos inicialmente escolher alguns destinos promissores onde há vários hotéis ou várias pousadas em fase de reabertura, fazendo reservas diretamente com estabelecimento e reconfirmando a sua disponibilidade antes de partir.
Como diz o clássico, "no fim tudo vai dar certo". E ainda não estamos no fim, visto que a situação atual está muito longe de ser aceitável. Mas vamos fazer a nossa parte! Em particular, neste blog até o final do ano 2020 serão publicadas exclusivamente matérias focadas em viagens pelo Brasil, e o ritmo de publicações será melhor do que nos anos anteriores.
Fotos do autor
Atualizado 07.06.2020
Que agradável viagem virtual acabei de realizar no blog de Viktor Pastoukhov.
ResponderExcluirSua narrativa é surpreendente motivadora e temos a grata sensação de realmente estar realizando um agradável passeio.
Parabéns Viktor!
Obrigado! Vamos viajar juntos aonde for possível!
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